«Os bairros são núcleos de sobrevivência da cultura cabo-verdiana», disse-me um dia o açoriano Eduardo, um dos fundadores da associação Moinho da Juventude, na Cova da Moura, o mais conhecido dos bairros de imigrantes cabo-verdianos da Grande Lisboa. Foi nesse bairro onde os casamentos e baptizados proporcionavam sessões de batuque – e por iniciativa da associação – que o grupo de batuque Finka Pé foi fundado em 1988, integrado essencialmente por um grupo de badias. A decisão de criar o grupo de batuque foi motivada por três razões: a promoção deste género musical, a divulgação da cultura cabo-verdiana e a preservação das tradições de Cabo Verde. No começo, Finka Pé limitou-se às actuações no bairro antes dos convites, passagens pela televisão e finalmente eventos importantes como a Exposição Universal de Lisboa, em 1998.
De acordo com Ezequiel Monteiro, um dos responsáveis do grupo Raiss di Funana, a preservação e promoção de determinados aspectos da cultura cabo-verdiana só são possíveis nos bairros. Os casos de Raiss di Funana, na Pedreira dos Húngaros, de Finka Pé, na Cova da Moura, e da Voz d’África, no antigo bairro das Marianas confirmam essa realidade. Os últimos anos no bairro das Marianas, no município de Cascais (finais dos anos 1990 – começo de 2000), não trazem boas recordações aos residentes devido à insegurança que ali pairava. Muitos pais temiam pelo futuro dos filhos num meio onde o tráfico e consumo de droga eram corrente.
Assim sendo, Voz d’África é um dos poucos aspectos positivos das Marianas (este e a maioria dos bairros na Grande Lisboa acabaram por ser destruídos no quadro do Programa de Erradicação das Barracas). O grupo de batuque foi fundado em 1997 por pouco mais de 20 cabo-verdianas por iniciativa do então presidente da Câmara Municipal de Cascais. Impressionado com a actuação de um grupo de batuque durante umas férias em Santiago, o autarca incentivou algumas badias do bairro a seguirem as mesmas pisadas. Voz d’África nasceu, gravou parte do seu trabalho e ganhou uma madrinha: a cantora Celina Pereira.
O Raiss di Funana preferiu o outro grande género musical da ilha de Santiago – o funana – mas, como os grupos de batuque, vem de um bairro lisboeta. «Nascemos na Pedreira dos Húngaros. Dificilmente o grupo teria aparecido se residissemos nos prédios de uma cidade dormitório, misturados com os brancos. Eles não gostam de barulho. No bairro estás mais à vontade», justifica Ezequiel Monteiro.
Deste grupo, sabe-se que começou por se chamar Pila-Kana antes de trocar de nome em 1998 e de rumo: depois das actuações nos casamentos baptismos e outros eventos organizados na sede da Associação Cultural e Desportiva Pedreira dos Húngaros, Raiss di Funana lançou dois álbuns.
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