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Música de Cabo Verde

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Batuque

01/02/2014 3 Comentários

No seu dicionário enciclopédico e bilingue dedicado a Cabo Verde, Françoise e Jean-Michel Massa notam que em todos os países lusófonos, o batuque está ligado à dança, ou seja a um ambiente de festa. No arquipélago, o espaço do batuque era sobretudo montado durante as cerimónias de casamento, baptismo e todas as festas no meio rural em Santiago, onde nasceu. «Quando nasci (1897), o batuque já existia», diz Nha Gida Mendi, filha de um chefe de batuque e finaçon e uma batucadeira. No entanto, não existem referências que confirmem este dado. Nha Gida Mendi, considerada pelo investigador Tomé Varela como a mais culta de todas as batucadeiras, assim define o batuque: «Num restaurante, primeiro serve-se o prato principal e em seguida passa-se à sobremesa. A sambuna (ou tchabeta) representa o prato principal e o finaçon, a sobremesa». Numa sessão de batuque, é assim que acontecem as coisas. A festa começa com o batuque, melhor a sambuna, e acaba com o finaçon (o finaçon é uma sucessão de provérbios e conselhos declamados com inflexões vocais).

Batuque (foto Marlene Nobre)

Batuque (foto Marlene Nobre)

As mulheres se sentam em círculo, as dançarinas ocupam o centro e colocam um pano enrolado entre as pernas. Até há bem pouco tempo, utilizava-se o pano bicho (ou pano terra) que os portugueses chegaram a utilizar no continente africano como moeda de troca na compra de escravos. Porém, devido ao seu elevado preço (aproximadamente cinco mil escudos cabo-verdianos, ou seja, cerca de metade do salário de uma trabalhadora rural), muitas mulheres substituíram-no por um pedaço de tecido qualquer, uma pequena almofada ou um saco de plástico cheio de jornais. O som é quase o mesmo.

O pano substitui a percussão e marca o ritmo enquanto uma das mulheres entoa uma melodia. Segue-se o coro do resto do grupo. Uma outra mulher entra no meio da roda, um pano à volta da cintura, os braços em direcção ao céu e começa a dançar. Bate-se com mais força. É a tchabeta! A mulher mexe a cintura, cada vez com mais força. Da ku torno! O ambiente aquece. Rapica tchabeta! A excitação é geral. As pessoas à volta da roda gritam e aplaudem.

Antes da chegada das aparelhagens, o batuque animava todos os momentos importantes da vida como os casamentos ou baptizados. Dançava-se, cantava-se, ria-se durante horas. E quando chegava a hora de regressar à casa, a cantadeira de finaçon aparecia. Um pouco como a sobremesa, depois do almoço. Era a parte mais difícil, segundo Bibinha Kabral, outra figura desse género musical. «Tchabeta é brincadera. Finaçon ta dana língua». A tchabeta é um gozo enquanto o finaçon dá cabo da língua.

«É a parte sagrada», explica Tomé Varela, autor de obras sobre algumas grandes figuras do finaçon. Nessa altura, para-se tudo para ouvir os conselhos transmitidos pela finadera. Porque é de conselhos que se trata, como nesse texto de Nacia Gomi:

Nacia Gomi e Ntoni Denti d´Oro

Nacia Gomi e Ntoni Denti d´Oro

Mocinhos, nhos ubi konsedju.
Mi é bedju, m’conxé mundu.
Ku kasamenti ka ta brincadu.
Nhos pensa bem nhos cunça bai

(Escutem meu conselho, jovens / Sou velho e conheço o mundo / Não se brinca com o casamento / Pensem bem antes de assumir este compromisso).

Segundo Ntoni Denti d’Oru, um dos poucos homens nesse mundo feminino, entoava-se o finaçon para que as batucadeiras pudessem descansar. O batuque de Denti d’Oru fazia-se com um tambor, os panos de três mulheres e a cimboa de Manu Mendi, uma guitara monocorda de origem sudanesa. É dos poucos a reunir tantos instrumentos no batuque. Não se pode falar do batuque e finaçon sem evocar Nacia Gomi, a mais criativa de todas as finaderas. Tinha 14 anos quando cantou pela primeira vez em público depois de desafiada por uma cantadeira mais velha e mais experiente. Aceitou o desafio e não mais parou. Chica Leal, Emília Borges, Xinta Barros, Miranda Tavares, Pandonga foram igualmente nomes importantes do batuque.

À semelhança do que aconteceu com o funana, o batuque acabou por ser apropriado por jovens artistas da Praia, em meados dos anos 1990. Orlando Pantera, falecido em 2001, iniciou as pesquisas marcadas pela introdução do violão e da percussão mas não chegou a gravar qualquer disco a solo. Princesito, Tcheka, Vadú e outros companheiros deram continuidade à obra, materializada no álbum “Ayan“. O seu talento foi confirmado com o lançamento de álbuns a solo. Do lado das jovens mulheres, destaque para Lura e Mayra, duas cantoras que a imprensa internacional apresenta já como figuras de amanhã.

Arquivado em:Anexos

Comentários

  1. maria coutinho diz

    30/07/2014 em 18:34

    Gostaria de saber, pois estou a escrever sobre o finaçon, alguns dos proverbios ditos e cantados no finaçon.

    Agradeço antecipadamente.

    Responder
    • zemonte diz

      13/08/2015 em 19:14

      Olá,
      desculpe a demora em responder.
      Quando à questão, aconselho-a a contactar o Prinzezito, via facebook, pois ele tem muita informação
      relativo à finaçon.

      Veja este video sobre o tema:

      Batucu e Finaçon da Ilha de Santiago [Cabo Verde] – Palestra do Princezito
      https://www.youtube.com/watch?v=l_RPzxhOnao

      Responder

Trackbacks

  1. Géneros musicais de Cabo Verde - Música de Cabo Verde diz:
    05/07/2016 às 22:52

    […] denunciam uma ligação europeia mas também latino-americana extramamente forte, e do outro, o batuque e o finaçon, que conservam uma influência africana notória. A música cabo-verdiana inclui ainda […]

    Responder

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Autor: Música Cabo-verdiana em Lisboa

Vladimir Monteiro (jornalista) Vladimir Monteiro (jornalista)

Licenciado em Jornalismo pelo CESTI - Universidade Cheikh Anta Diop de Dakar (Senegal), Vladimir Monteiro é igualmente autor de Portugal/Crioulo (a emigração cabo-verdiana na Grande Lisboa)...

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